PEDALAR É PRECISO!

sábado, 26 de maio de 2012

A AUTO-ESTIMA ALEMÃ E OS CUSTOS DA BANCARROTA GREGA


O dia 6 de Maio de 2012 é um dia a fixar. A importância deste dia estava, aliás, fixada desde há mais de um ano, por causa das eleições francesas e do que delas resultaria quanto ao futuro do famoso e pérfido casal Merkozy, casal franco-alemão impante na sua prosápia de condutor dos destinos da Europa e quiçá da humanidade.
Nesse dia que talvez possa vir a ser histórico, consumou-se o divórcio do dito casal, aqui anunciado. Resta saber quais é que vão ser as consequências da ruptura matrimonial.
No imediato, ainda passou pouco tempo, mas muitas coisas já mudaram: a arrogância alemã está com problemas de auto-estima, essa malta merkeliana começou a ficar com dúvidas, sente-se insegura. O realinhamento e as discussões políticas em torno do binómio austeridade/crescimento pende claramente para o lado francês e dos países do Sul.
Aliás, o Hollande que nos foi apresentado como representante da esquerda mole, afinal, está-se a revelar um fino estratega.
Fez-se acompanhar pelo primeiro-ministro espanhol na sua viagem de combóio para o encontro dito informal de Bruxelas, não falou com a Merkel antes da reunião e tem programadas reuniões com o Monti italiano e com o primeiro-ministro polaco. Uma estratégia de cerco ao poder alemão. Apoiado.
 O nosso (deles) Coelho não me parece que esteja na sua agenda. De resto, o tal de Coelho prefere aparecer sorridente na fotografia ao lado da Merkel, que olha para ele toda babada. Não sou eu que vou contestar à senhora tal devaneio.
Resumindo, a eleição do Hollande veio baralhar as relações dentro do vértice europeu, está em movimento um puzzle com muitos embustes à mistura, as relações de forças estão a mudar de dia para dia.
Os políticos, os  jornalistas ou fanáticos da política que estão mais ou menos por dentro do que está a acontecer, todos os fanáticos de jogos de bastidores devem estar à beira, desculpem lá a comparação, duma espécie de orgasmo, duplo ou triplo.
E não arriscam apostas.
Resta falar do essencial que está em causa neste orgástico jogo: a questão da Grécia.
Todos os responsáveis europeus têm andado a declarar publicamente que fazem questão que a Grécia permaneça no euro e na UE. Sabe-se, porém, que todos eles têm gente a fazer contas sobre as consequências da saída da Grécia.
E se afirmam que querem a Grécia no euro é por duas razões.
Apostam no apoio à Nova Democracia e ao Pasok nas eleições e combatem a esquerda anti-tróika.
 Mas esta gente habituada a controlar todas as situações está em pânico.
Pânico, porquê?
É que, se a esquerda radical grega ganhar as eleições de 17 de Junho, alemães, franceses, holandeses, finlandeses e toda essa malta vão mesmo que ter que fazer contas.
E não se trata apenas de contar os milhões que os seus bancos e outros grupos capitalistas vão perder com a bancarrota grega.
São contas mais políticas do que financeiras. Se a Grécia sair do euro e entrar em ruptura com a UE, o que é que acontece com a Nato, o Mediterrâneo Oriental, a Turquia, o Médio Oriente, a Rússia?
Do ponto de vista da Europa e dos Estados Unidos, a Grécia continua a ser o lugar mais estratégico no confronto com o Oriente mediterrânico próximo, o Oriente médio muçulmano e o Oriente eslavo.
Façam, então, as contas bem feitas, tenham cuidado, não brinquem com o fogo.
Acabem com o massacre dos gregos enquanto é tempo. Acaba por sair mais barato e menos perigoso do que insistir na obsessão germânica de castigar os gregos pelos seus pecados e correr com a Grécia para o inferno da bancarrota.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

SALVAÇÃO DO EURO: DA CONTA BANCÁRIA PARA O COLCHÃO





A Espanha claudica, a Grécia afunda-se, Portugal descobre, pela voz do seu primeiro-ministro, que o desemprego afinal ajuda a mudar para uma vida melhor.


O Hollande ganhou as eleições, o Hollande e o seu governo são parvos, tem andado a proclamar no Público a voz autorizada do sr. Vasco Pulido Valente.


Portugal é um país de mentes brilhantes.


A união europeia está à beira de se desfazer, o sr. Henrique Monteiro, no Expresso, apela aos europeístas para salvarem a Europa e conjura os socialistas a demarcarem-se claramente da esquerda anti-europeia.


Pergunto, onde é que está essa tal de esquerda anti-europeia?


Os únicos anti-europeístas de que tenho notícia não são de esquerda, pelo contrário, são alguns partidos europeus da direita populístico-nacionalista, na primeira linha dos quais estão partidos holandeses, austríacos e franceses.


Mesmo a chamada esquerda radical grega tem feito um discurso pró-união europeia e pró-euro.


E em Portugal, por uma espécie de milagre das rosas, o PC e o BE mantêm-se convictamente na linha europeia politicamente correcta, a par, aliás do CDS-PP, cujos devaneios anti-CEE há muito que passaram à história.


Vejamos então o que é que coloca a união dita europeia na situação de precisar de apelos para a sua salvação.


Será a ameaça incarnada pelas direitas nacionalistas e populistas europeias?


Será alguma conspiração da chamada extrema esquerda, em cujo espectro político alguns distintos comentadores jornalísticos e do pequeno ecrã deste pequeno país incluem o Syriza grego, que, segundo as sábias palavras do sr. Monteiro, é uma espécie de bloco de esquerda?


Haverá ainda algum partido de extrema esquerda na Europa suficientemente ameaçador e perigoso que motive um apelo à salvação da Europa?


Voltemos ao princípio, voltemos ao ranking dos países que estão à beira do precipício e que, por estarem nesse lugar eminentemente perigoso, arrastam toda a Europa para a mesma vertigem do abismo.


O precipício da Grécia tem uma história e tem responsáveis óbvios, desde os capitalistas gregos que têm roubado e explorado à tripa forra, que não pagam impostos, tal como a igreja ortodoxa que mantém privilégios de séculos e muitos e muitos cúmplices e apaniguados desse sistema, até aos bancos alemães, franceses e outros, até às indústrias de armamento alemãs e outras e à Nova Democracia e ao Pasok que, desde há quase quarenta anos têm pactuado com todas essas roubalheiras e infâmias.


Esse tem sido o sistema grego. Será o sistema reformável?


Boa pergunta, boa pergunta que deve ser respondida pelos gregos. Não é assunto para a troika, para os alemães, para a burocracia de Bruxelas.


Os alemães impediram o Papandreou de fazer o referendo de Dezembro e agora vão tentar impedir as eleições gregas de 17 de Junho.


Talvez conseguiam, sabe-se lá! Entretanto, vão atirando achas para a fogueira.


Quem é que pode salvar a união europeia?


Os europeístas? Mas quem é que essa gente?


A gente que em três dias retirou mil e duzentos milhares de euros dos bancos gregos?


As pessoas que têm os seus depósitos em bancos espanhóis ameaçados de falir em cadeia, como um castelo de cartas?


Os alemães, fechados na sua arrogante supremacia de vendedores de submarinos, de piratas predadores capitalistas?


Os europeístas gregos que, segundo o sr. Monteiro, é preciso apoiar e ajudar a convencer o povo e a vencer nas urnas?


A vencer nas urnas contra quem? Contra a extrema esquerda, contra a extrema-direita, contra os coronéis?


Como cantava o Zeca Afonso, o povo é quem mais ordena.


O problema é que nesta altura, a sorte da Europa já não está nas mãos da extrema direita, nem da extrema esquerda, nem dos povos europeus, nem da sra. Merkel.


A sorte da união dita europeia passou a estar nas mãos de quem tem depósitos num banco europeu, seja ele qual for. Os eleitores gregos são a favor do euro, e como são eleitores prevenidos, mais vale ter 100 euros debaixo do colchão do que 1.000 dracmas num banco.


A opção pelo banco-colchão está, pois, de volta à actualidade.


Apesar de velha história, o colchão-banco é que vai resolver o problema do euro, não vale a pena fazer grandes conjecturas, cansar a cabeça.


Em breve, a realidade retomará o seu curso e a maior parte dos políticos europeus será arrumado nos arquivos poeirentos da história. Não salvaram o euro, não salvaram a dita união europeia, apenas desgraçaram a vida de muitos milhões de pessoas


A história, tal como no passado, continuará o seu rumo. Como de costume, por cima de muitos cadáveres.




domingo, 6 de maio de 2012

HOLLANDE TALVEZ, GRÉCIA NÃO

Desde o Verão passado, quando se iniciou o patético ciclo de cimeiras europeias, quase semanais, para salvar o euro, resolver as dívidas soberanas e punir com austeridade violenta os chamados PIGS, desde esse Verão de má memória, era mais do que óbvio, para quem não se limitasse a nadar à superfície, que o dia 6 de Maio de 2012 era uma data-fronteira destinada a pôr em causa todo esse cafarnaum dominado pela chanceler Merkel, apoiada na diligente bengala francesa do hiperactivo Sarkozy.
Pois bem, chegou o 6 de Maio.
Se Deus quiser e se os franceses não aparvalharem, o Sarkozy será substituído em 6 de Maio pelo novo presidente François Hollande, que tomará posse no dia 15.
Em França, desde que foi instituída a V República gaulista, a esquerda esteve no poder apenas uma vez. A França tem pois uma velha história de país de direita, além de chauvinista e muitas outras coisas sinistras. Mas é a França da Grande Revolução, a França de Jaurès, de Jean Moulin e de muita outra gente, Claude Bernard, Balzac, Léo Blum, Léo Ferré, Juliette Gréco, Coluche, Édith Piaf, a lista não tem fim.
Se François Hollande ganhar as eleições, 2012 será um novo 1981, quando Miterrand chegou ao Élysée, será um momento de transfiguração da França e das forças sociais que aspiram a uma profunda mudança após 17 anos de presidências de direita.
Desde a tomada de poder da Alemanha sobre a união europeia, durante todos estes meses, quase um ano, os nossos políticos, a nossa imprensa, a televisão, os intelectuais e comentadores de toda a espécie ninguém equacionou a possibilidade de o poder mudar de mãos em França e ninguém reflectiu sobre as consequências dessa mudança em relação à união europeia, ao euro e a Portugal.
De repente, deram-se conta que, afinal, podia estar prestes a começar um novo ciclo. Ficaram histéricos.
A Europa é demasiado velha e antiga, mas a união europeia e o euro são demasiado recentes e sem história. Isso talvez explique por que é que os políticos e os tipos que têm governado a partir de Bruxelas nos tenham conduzido ao desastre a que chegámos.
São políticos sem a sabedoria de Maquiavel, são políticos incapazes de distinguir entre táctica e estratégia, não sabem ver para além das pedras da calçada. Políticos que navegam à vista, que têm a visão curta. Políticos não eleitos que à boa maneira soviética têm exorbitado, impondo aos povos europeus a cartilha neo-liberal monetarista importada de Chicago.
A esquerda europeia, ou seja, o que resta dela, há muito tempo que se submeteu a essa cartilha, imposta pela Alemanha, apoiada pelos seus aliados da banca americana e internacional e pelos políticos nortistas seus apaniguados.
Para se redimir de todas as rendições e traições que cometeu nos últimos quarenta anos, a esquerda europeia não pode deixar de mudar de rumo. Tem que ganhar credibilidade.
Gostava de acreditar nessa redenção. A esperança é sempre a última a morrer e, assim sendo, atrevo-me a pensar que talvez a eleição do Hollande ajude a mudar na Europa a relação de forças entre esquerda e direita, entre norte e sul. Talvez ajude a pôr a frau Merkel na ordem e a mandá-la para casa em 2013. Talvez essa eleição contribua para repensar a esquerda europeia, dando prioridade ao pleno emprego, à economia social, à equidade, à justiça e aos direitos sociais. Talvez contribua para pôr os mercados em sentido, talvez contribua para pôr as finanças e os bancos ao serviço da economia. Talvez…
Mas o 6 de Maio não é apenas o dia das eleições presidenciais em França. Neste dia, também a Grécia vai a votos. A união europeia escolheu a Grécia para ser uma espécie de laboratório político em que os gregos são as cobaias. Ora, como em todas as experiências de laboratório, quem se lixa são sempre as cobaias...
As perspectivas do 6 de Maio grego são tenebrosas.
Em Dezembro passado, o Papandreu queria fazer um referendo sobre o euro e a união europeia, referendo que foi proibido pela Alemanha e os seus apaniguados.
Os resultados das eleições deste domingo de Maio, entre outras coisas virão dar razão ao Papendreu. Em Dezembro, talvez o referendo ainda fosse a tempo de dar uma oportunidade ao povo grego de exprimir a sua vontade. Uma última oportunidade para a democracia grega.
Agora, é tarde demais.
O eixo Berlim/Bruxelas fez a sua experiência com as cobaias da mais antiga democracia do mundo.
Ficamos à espera dos resultados.
Mas na minha cabeça continuo a ouvir, como num filme, as botas dos coronéis gregos à frente da tropa.
Os deuses já não moram no Olimpo.