Se há no mundo um
país que exige a nossa atenção, principalmente durante estes conturbados dias,
esse país é a Turquia.
A Turquia, desde há
muitos séculos, sempre assombrou a Europa.
Na corte de Louis
XIV, Lully escreveu a famosa marche à la
Turque em que gozava com os turcos. A corte e o rei apreciaram, além do
mais a música era genial. Outros compositores seguiram o exemplo.
Os europeus sempre
olharam a Turquia de lado, porque no fundo, tinham medo desses orientais que
eram ao mesmo tempo tão longínquos e tão próximos dos europeus, e,
principalmente, não sabiam muito bem como lidar com a sua própria identidade.
Alguém devia ter as culpas disso, questão supérflua que não lhes aflorava as
mentes.
A Turquia foi há
muitos séculos o Império Romano do Oriente e, entre esse Império do Oriente e o
Império do Ocidente houve sempre uma espécie de guerra larvar, se bem que, com a
queda, no séc. V, do império do ocidente, ou seja, o império romano
propriamente dito, quem passou a ficar na mó de cima foi o pessoal de
Constantinopla.
É uma história tão
longa, não esquecer a longa noite medieval, não há tempo para falar dela.
Do que vale a pena
falar é dos laços que perduraram ao longo de séculos e séculos entre os
cristãos do ocidente e os otomanos do oriente. O que é que resta actualmente dos
otomanos no ocidente?
Temos os imigrantes
turcos na Alemanha, por exemplo, muitos deles trucidados por grupos neo-nazis,
ou por outros germânico-racistas.
Na mesma linha de pensamento,
também constatamos a persistente rejeição da entrada dos turcos na união
europeia.
O que é que resta dos
cristãos no ex-império otomano?
Lá continua o estreito
do Bósforo que separa a Turquia europeia da Turquia asiática.
E resta-nos a memória
do grande Kemal Atartuk que impôs à Turquia nos anos 20 a ideia europeia de
laicidade.
Resumamos, temos
ainda e não é coisa pouca, a rivalidade, para não dizer coisa pior, da Turquia
em relação à Grécia e vice-versa.
A propósito,
comparemos a Turquia com a Grécia.
A Grécia é o país
mais desgraçado da união europeia e fica ali, numa zona de alto interesse
político-estratégico, mesmo em frente à Turquia.
Mas, enquanto a
Turquia tem uma economia próspera, se perfila como uma grande potência regional
e até como exemplo para os países recém-entrados no ciclo infernal da primavera
árabe, e que, por tudo isso, é recebida com calorosas palmas nas costas pelo
presidente dos USA, a Grécia, coitada, provavelmente graças à sua pertença à
máquina de destruição maciça chamada união europeia, nunca mais voltará a ser
um país digno dessa designação.
Podem-se tirar
algumas conclusões? Sim, hipotéticas conclusões.
Se a Turquia tivesse
entrado para a união dita europeia ou, na pior das hipóteses, para o euro,
neste momento, a sua economia seria pior do que é a da Alemanha, que não está
em grande estado.
Temos, pois um primeiro
ponto, favor da Turquia: ainda bem que a Alemanha e a França não quiseram os
turcos na união europeia.
Segunda conclusão,
será a Turquia um bom exemplo para a Tunísia e o Egipto, países-vanguarda da
chamada primavera árabe?
Nem por sombras. A Tunísia
e o Egipto ainda estão na pré-história. A Turquia já está, no mínimo, a meio
caminho.
Meio-caminho de quê?
Meio caminho entre aquilo que poderá ser uma eventual sociedade laica, cuja
religião maioritária é o islão, mas que respeita convictamente a liberdade
individual e os direitos consagrados na Declaração Universal dos Direitos do
Homem e uma sociedade de dominância fundamentalista islâmica, semelhante às
sociedades que, até à Revolução Francesa, eram dominantes no ocidente europeu
cristão.
E daqui decorre a
seguinte e muito crucial questão: poderá alguma vez a Turquia fazer a síntese
pacífica, construtiva e de futuro entre o antigo império romano do oriente,
mais tarde otomano, e o império romano do ocidente, mais tarde derrubado pela
tomada da Bastilha?
Tudo isso está em
jogo agora, por estes dias, na velha Turquia.
Turcos
otomano/islamistas dum lado, turcos atartukistas/europeístas do outro. Qual é
que vai ser o resultado desta batalha decisiva, vai cair do lado de cá do
Bósforo ou do lado de lá?
Questão última e não
menos importante: poderá o rastilho turco iluminar as almas indecisas do lado
de cá do Estreito, deste lado decadente do antigo ocidente cristão, agora
transformado numa espécie de cemitério europeu?
Poderá esse rastilho
iluminar essas almas para se libertarem das novas ditaduras romano-germânicas
que destroem a Europa?
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