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quinta-feira, 6 de junho de 2013

O RASTILHO TURCO

 


Se há no mundo um país que exige a nossa atenção, principalmente durante estes conturbados dias, esse país é a Turquia.

A Turquia, desde há muitos séculos, sempre assombrou a Europa.

Na corte de Louis XIV, Lully escreveu a famosa marche à la Turque em que gozava com os turcos. A corte e o rei apreciaram, além do mais a música era genial. Outros compositores seguiram o exemplo.

Os europeus sempre olharam a Turquia de lado, porque no fundo, tinham medo desses orientais que eram ao mesmo tempo tão longínquos e tão próximos dos europeus, e, principalmente, não sabiam muito bem como lidar com a sua própria identidade. Alguém devia ter as culpas disso, questão supérflua que não lhes aflorava as mentes.

A Turquia foi há muitos séculos o Império Romano do Oriente e, entre esse Império do Oriente e o Império do Ocidente houve sempre uma espécie de guerra larvar, se bem que, com a queda, no séc. V, do império do ocidente, ou seja, o império romano propriamente dito, quem passou a ficar na mó de cima foi o pessoal de Constantinopla.

É uma história tão longa, não esquecer a longa noite medieval, não há tempo para falar dela.

Do que vale a pena falar é dos laços que perduraram ao longo de séculos e séculos entre os cristãos do ocidente e os otomanos do oriente. O que é que resta actualmente dos otomanos no ocidente?

Temos os imigrantes turcos na Alemanha, por exemplo, muitos deles trucidados por grupos neo-nazis, ou por outros germânico-racistas.

Na mesma linha de pensamento, também constatamos a persistente rejeição da entrada dos turcos na união europeia.

O que é que resta dos cristãos no ex-império otomano?

Lá continua o estreito do Bósforo que separa a Turquia europeia da Turquia asiática.

E resta-nos a memória do grande Kemal Atartuk que impôs à Turquia nos anos 20 a ideia europeia de laicidade.

Resumamos, temos ainda e não é coisa pouca, a rivalidade, para não dizer coisa pior, da Turquia em relação à Grécia e vice-versa.

A propósito, comparemos a Turquia com a Grécia.

A Grécia é o país mais desgraçado da união europeia e fica ali, numa zona de alto interesse político-estratégico, mesmo em frente à Turquia.

Mas, enquanto a Turquia tem uma economia próspera, se perfila como uma grande potência regional e até como exemplo para os países recém-entrados no ciclo infernal da primavera árabe, e que, por tudo isso, é recebida com calorosas palmas nas costas pelo presidente dos USA, a Grécia, coitada, provavelmente graças à sua pertença à máquina de destruição maciça chamada união europeia, nunca mais voltará a ser um país digno dessa designação.

Podem-se tirar algumas conclusões? Sim, hipotéticas conclusões.

Se a Turquia tivesse entrado para a união dita europeia ou, na pior das hipóteses, para o euro, neste momento, a sua economia seria pior do que é a da Alemanha, que não está em grande estado.

Temos, pois um primeiro ponto, favor da Turquia: ainda bem que a Alemanha e a França não quiseram os turcos na união europeia.

Segunda conclusão, será a Turquia um bom exemplo para a Tunísia e o Egipto, países-vanguarda da chamada primavera árabe?

Nem por sombras. A Tunísia e o Egipto ainda estão na pré-história. A Turquia já está, no mínimo, a meio caminho.

Meio-caminho de quê? Meio caminho entre aquilo que poderá ser uma eventual sociedade laica, cuja religião maioritária é o islão, mas que respeita convictamente a liberdade individual e os direitos consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem e uma sociedade de dominância fundamentalista islâmica, semelhante às sociedades que, até à Revolução Francesa, eram dominantes no ocidente europeu cristão.

E daqui decorre a seguinte e muito crucial questão: poderá alguma vez a Turquia fazer a síntese pacífica, construtiva e de futuro entre o antigo império romano do oriente, mais tarde otomano, e o império romano do ocidente, mais tarde derrubado pela tomada da Bastilha?

Tudo isso está em jogo agora, por estes dias, na velha Turquia.

Turcos otomano/islamistas dum lado, turcos atartukistas/europeístas do outro. Qual é que vai ser o resultado desta batalha decisiva, vai cair do lado de cá do Bósforo ou do lado de lá?

Questão última e não menos importante: poderá o rastilho turco iluminar as almas indecisas do lado de cá do Estreito, deste lado decadente do antigo ocidente cristão, agora transformado numa espécie de cemitério europeu?

Poderá esse rastilho iluminar essas almas para se libertarem das novas ditaduras romano-germânicas que destroem a Europa?
 
 

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