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terça-feira, 24 de abril de 2012

MARINE LE PEN E MELENCHON: DIVERGÊNCIA COM FUTURO





Os resultados da 1ª volta das eleições presidenciais francesas não se compadecem com leituras apressadas, merecem reflexão.


Primeira lição: um terço dos eleitores franceses votou contra os políticos e o sistema político francês, dominado por banqueiros e grandes capitalistas que impõem a austeridade, o desemprego, a pobreza e a precariedade. Estes eleitores votaram também contra a união europeia e o poder germânico ultra-monetarista. Votaram pela liberdade e pelo Estado Social, votaram pela soberania e pelo regresso das nações europeias, contra as ditaduras federalistas.


Como é que se chega a estes 33%? É simples: somam-se os 18% da Marine Le Pen, os 11% do Mélenchon e os 4% reunidos pela ecologista Eva Joly, mais os dois candidatos trotskistas. Por outras palavras: soma-se a direita dita extrema e a esquerda igualmente extrema, obtém-se um cocktail, será Molotov, não será, não sei.


Segunda lição: a união europeia e todos seus comparsas, agentes e cúmplices no empobrecimento e esclavagismo dos povos europeus, quase desmaiaram no seu pânico de virgens tontas com o score conseguido pelo Front National. As bolsas caíram, a Merkel mandou dizer que estava muito preocupada com o resultado da extrema-direita francesa. Se porventura houvesse um golpe fascista na união dita europeia, esse pessoal estaria entre os primeiros a apoiar. Por que é que estão tão preocupados?


Terceira lição: ninguém teve a coragem de somar os trinta e três por cento e dessa soma tirar as conclusões que se impõem.


Não é apenas o governo do Coelho que é surdo, mudo, incompetente e medíocre. Sabemos que não passa dum governo que pretende ser bom aluno, sempre atento às ordens que recebe da troika, sempre fiel ao seu papel de mordomo estilo séries inglesas. Fiéis ao seu estatuto de lacaios, os responsáveis deste governo ainda em funções não se dão conta que os seus chefes conseguem ser ainda mais míopes e medíocres do que eles próprios que não passam de simples lacaios.


Fechados na sua torre de marfim, inebriados pela perigosa sensação que é a de acharem que mandam em não sei quantos milhões de europeus, essa gente de Bruxelas, de Paris, de Helsínquia, de etc não se dá ao trabalho de raciocinar sobre os factos, sobre os factos políticos que têm a ver com a vida desses tais milhões de europeus.


Cada vez que há uma eleição, lá vão agitando o espantalho da extrema-direita. Mas, de espantalho em espantalho a extrema-direita europeia vai crescendo e, de espantalho em espantalho, os tipos que nos impõem a austeridade, a miséria e o desespero vão ficando cada vez mais fora da realidade. Não passam de marionetes dos mercados e do capital financeiro sem pátria.


O facto mais extraordinário destas eleições é que elas mostram que não é só a extrema direita que cresce, a extrema esquerda francesa fez uma boa performance.


Sociologicamente e politicamente estes extremos, aliás, não se distinguem muito. Estão em confronto, há uma guerra entre eles, mas os seus programas são praticamente idênticos.


O Mélenchon, apesar das qualidades de notável tribuno de esquerda, perdeu a sua batalha contra a Marine Le Pen, porque a candidata do Front National foi a que recolheu mais votos entre os operários e entre os jovens.


Esta direita é uma nova direita, primeira conclusão.


É uma direita proletária contra o desemprego, contra a desindustrialização, contra a precaridade, uma direita apoiada pelas populações mais abandonadas, que vivem em zonas desertificadas, que perderam as terras, que ficaram sem o seu pequeno comércio, que perderam o seu modo de vida. Populações que passaram à história, que não confiam e que não esperam nada dos políticos que mandam no sistema.


Populações que são vítimas da mundialização, da importação de produtos made in China, de produtos fabricados em países sem segurança social, onde os trabalhadores não têm quaisquer direitos, países que exploram trabalho infantil e mão-de-obra paga miseravelmente. Países que praticam o dumping social, que fazem concorrência desleal e que, desse modo, se tornaram responsáveis pela falência de muitas e muitas empresas e de muitos e muitos trabalhadores europeus.


Esta nova direita percebeu tudo isto. Uma parte da esquerda, seja mais ou menos extrema, também começa a perceber os desmandos da mundialização selvagem que destrói emprego e cria miséria. Os tais 33% contra o sistema encontram-se neste terreno e concorrem entre si junto dos excluídos e vítimas do sistema euro-liberal sem fronteiras.


Uma parte do sucesso desta nova direita deve-se ao seu discurso xenófobo que exprime a raiva de todos quantos acham que perderam o emprego por causa dos imigrantes que trabalham a qualquer preço.


A raiva contra os imigrantes é uma velha história que tem justificação em fatos incontestáveis. O patronato, grande ou pequeno, sempre utilizou a mão-de-obra imigrante como um instrumento para fazer baixar os custos do trabalho. Entre o patronato sem escrúpulos e os desempregados indígenas que lutam por um emprego em condições dignas, ficam entalados os desgraçados dos imigrantes.


Dito por outras palavras: as esquerdas, extremas ou moderadas, não souberam até hoje fazer face ao discurso xenófobo das direitas extremas.


Ò Melanchon, perdeste a batalha contra a Marine Le Pen porque não foste capaz de apresentar alternativa ao discurso frontista baseado na xenofobia fácil contra o estrangeiro, contra todo aquele que é diferente, discurso que responsabiliza os imigrantes de França, principalmente os muçulmanos, pela criminalidade, pela insegurança e pelo desemprego.


Entre os 18% dos eleitores que apoiaram a extrema-direita e os restantes que fazem parte do terço dos eleitores que se sentem abandonados e ameaçados pelo sistema não existem diferenças sociais. Estão todos no mesmo barco.


Com estas eleições, talvez as esquerdas, radical, extrema, moderada, francesa ou europeia, tenham começado a perceber isso.


Não serve de nada, antes pelo contrário, a chamar fascistas aos frontistas de direita.


Na luta política, mais do que conhecer os nossos amigos e correligionários, o que conta é sabermos conhecer os nossos adversários.






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