Certos europeus, claro que estou a falar de quem manda na CEE do velho continente, não têm emenda. Vale a pena falar dos americanos?
É porque a história destes é bem curta, são filhos do puritanismo inglês com aquela retórica do sonho americano, os filmes de cowboys, subiram na vida a massacrar os povos americanos, a quem por ignorância congénita apelidaram de índios, massacraram os vietnamitas, os americanos são um povo que teve o Gershwin, a Greta Garbo, o John Ford, o Bukowski, o John dos Passos e muitos outros, é verdade que eram todos imigrantes, é um povo, dizia eu, que ainda anda à procura de uma identidade, é natural, pensam sobretudo nas suas próprias prioridades e interesses imediatos, egoístas, deslumbradas e indignas prioridades, armamento, petróleo, wall street, estão ainda muito longe do que é ser um povo antigo com substrato, de uma história que tenha sido familiar de muitas e miseráveis tragédias e terríveis vilanias, de sublimes criações do espírito humano, estão séculos atrasados do que é ser europeu, não é que eu ache que ser europeu é o máximo, de facto tenho muitas razões para não me sentir europeu, os americanos dos states não tiveram a oportunidade, e isso é para eles um grande handicap, de serem herdeiros directos de uma longa história, longa, triste, trágica, dramática e fantástica. História que começou no mediterrâneo, facto que eles desconhecem, para eles os gladiadores eram uns heróis que viviam ali para os lados da Pensilvânia.
História que vem do Mediterrâneo do Egipto dos Faraós, do Mediterrâneo da Grécia, de Tróia, de Roma. Mediterrâneo que, no seu atrevido provincianismo, os americanos continuam a achar que lhes pertence.
Na última vez que estiveram no Egipto com algum éclat, os europeus da nossa era admiraram o Napoleão clamando do alto destas pirâmides, não sei quantos séculos vos contemplam.
Da última vez que lá estiveram foi na guerra do Suez, talvez a memória me atraiçoe, creio que foi em 1956. Mas nessa altura, saíram de cena com o rabo entre as pernas.
Na ocasião, aliás, os americanos passaram uma grande rasteira aos seus “aliados” europeus. Provavelmente, talvez seja essa a explicação, porque tinham entretanto aprendido alguma coisa com os seus mestres europeus.
Agora juntos, europeus e americanos acham que eles é que sabem como resolver o “problema” do Egipto. É o velho reflexo pavloviano do euro-americano-centrismo, colonialismo, paternalismo, complexo de superioridade da raça superior.
Lá vêm 1975, o PREC, a CIA, o Carlucci e o Dr. Soares à minha memória.
Será o tal “problema”do Egipto o fundamentalismo islâmico, a Irmandade Islâmica, que, aliás, se chama Muçulmana desde 1920?
Os americanos e os europeus não estão muito certos, talvez seja, talvez não seja sabe-se lá. A verdade é que, sobre o Egipto, o que é que eles sabem de facto, a não ser o que mais lhes convém?
Tinham a obrigação de vasculhar os seus arquivos, de procurar nas suas memórias, mas isso não lhes interessa, não merece o esforço. Já esqueceram, essa é que é a verdade, que qualquer que seja o tal problema egípcio, quem o fabricou foram os próprios ingleses, os franceses e os americanos, por ordem cronológica. Claro que nisso tudo também há muitos árabes, otomanos e muçulmanos com culpas no cartório.
Quem foram os “protectores” do médio oriente em geral e do Egipto em particular até ao fim da monarquia egípcia do Faruk e da subida ao poder do Nasser em 1952/54? Foram os ingleses e os franceses.
Quem é que apoiou o Nasser na guerra do Suez contra os franceses e os ingleses? Foram os americanos, claro. Mas depois o Nasser mandou os gringos dar uma volta, aliou-se aos soviéticos e construiu a barragem de Assouam. Voltas à volta da história. Jogos de influência, patifarias, traições, sacanices, o Maquiavel não faria melhor.
E, no meio de tudo isto, destas jogadas escabrosas, alguém se tem preocupado com o povo egípcio, com os palestinianos, com os tunisinos, com os sauditas, com os marroquinos, com os iraquianos, com os líbios? A lista já vai longa. Quem é que tem alimentado as vergonhosas dinastias de déspotas e de vampiros que se têm alimentado do sangue de milhões de pobres e de miseráveis? Terá sido o fundamentalismo islâmico, será? Diz lá, Obama.
Oh! Obama, chouchou da intelligentzia mundial, o que é que tens andado a fazer?
Será que estás preocupado com os milhões de desgraçados, de pobres, de tiranizados que têm sofrido às mãos da quadrilha do Mubarak, dessa quadrilha que a América tem alimentado, para alimentar, entre outros, os fascistas israelitas que massacram os palestinianos nas suas casas, nos seus cubículos, nos seus espaços de miséria?
Ò Obama, vais-te aliar ao homem de mão do Mubarak, àquele tipo sinistro, o Suleiman ou lá como é que ele se chama, esse general do serralho dos generais todo-poderosos que há longos anos servem os interesses da clique Mubarak-USA-Israel?
É pena, decepcionas-me muito, Obama, saíste-me melhor do que a encomenda.
Pensa naquela gente, naqueles trezentos (ou serão muitos mais?) que vieram para a rua gritar por liberdade e morreram às mãos dos esbirros mubarakianos.
Egípcios, tunisinos, não são americanos, não são europeus, é isso. São povos inferiores, não sabem o que é isso da tal democracia do Tocqueville. São crianças, isso passa-lhes, não é Obama, não é Sarkosy, não é Merkel?
Para estes senhores, para todos aqueles que têm tido a ilusão de serem muito poderosos, é preciso que alguma coisa mude, para que tudo fique na mesma. Caros senhores, a máxima de Lampedusa orienta os vossos cálculos e os vossos lacaios estão no terreno, percebo que isso vos sossegue.
Resta saber se não haverá surpresas. É que a história nem sempre gagueja. No Cairo,a praça Tahrir continua a ferver no calor das liberdades com que os povos fazem e desfazem destinos.
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