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terça-feira, 6 de março de 2012

MERKEL CONTRA HOLLANDE


O futuro da união europeia envolve o futuro de muitos milhões de europeus.


Mas, neste gigantesco puzzle, o que sobressai são alguns jogos de bastidores e manipulações organizadas por políticos supostamente preocupados com a sobrevivência e progresso social da dita união.


O futuro da união é coisa séria, não porque a UE possa hoje ser considerada coisa séria, mas porque do futuro desta engrenagem pan-europeia, do futuro dessa espécie de união soviética - inventada através do fio do tempo desde os anos 50 por espíritos porventura bem intencionados – dele depende o futuro de muitos milhões de pessoas, principalmente gente frágil, desempregados, gente pobre, gente que inevitavelmente acaba por ser presa fácil dos jogos de poder de políticos poderosos associados a banqueiros, grandes multinacionais, vigaristas, ladrões, traficantes de toda a espécie. Tudo gente que, entre si, se conhece bem.


Neste dramático ano de 2012, o futuro da união europeia, e não se trata apenas de futuro de curto prazo, depende dos resultados das presidenciais francesas.


Há poucas semanas, a madame Frau Merkel foi a Paris manifestar expressamente o seu apoio ao sr. Sarkozy, candidato sortant às próximas eleições presidenciais francesas.


Graças ao Der Spiegel, respeitável jornal alemão, na sua edição publicada hoje, ficámos a saber que a dita madame chanceler terá assinado com outros chefes de governo da euro união, políticos apresentados como conservadores, uma espécie de pacto anti-François Hollande, candidato de esquerda à presidência da república francesa. Todos se comprometeram em não receber o candidato socialista.


Questão óbvia: se tal pacto é autêntico, o que farão os seus subscritores se o Hollande for eleito?


Não terá havido cerimónia da assinatura do tal pacto, não existem dessa sagrada união anti-Hollande registos iconográficos que possam excitar os telejornais de televisão.


Por mais sérios que sejam ou se apresentem, os grandes jornais que se consideram indispensáveis ao futuro da humanidade, nunca conseguem subtrair-se à grande vertigem do front of page, precisam que falem deles e, assim sendo, prestam-se facilmente a manobras de bastidores de agit-prop ao velho estilo soviético.


O que ressalta desta história é que o Der Spiegel foi descaradamente utilizado pelo estado-maior da Frau Merkel para mandar uma mensagem a alguns prováveis adversários. Uma mensagem de ameaça.


Toda a questão reside em identificar quem é que são os destinatários dessa ameaça.


Na lista do jornal alemão são apresentados como signatários do pacto anti-Hollande os improváveis nomes de David Cameron do Reino Unido, de Mário Monti da Itália e de Mariano Rajoy de Espanha.


Digo improváveis e explico porquê.


David Cameron recusou o pacto anti-déficit imposto pela Alemanha e, logicamente, não estava lá em Bruxelas na sexta-feira, 2 de Março para o assinar. Questão óbvia: por que carga de água é que o David, mesmo sendo conservador, havia de assinar um pacto contra o Hollande, com o argumento de que este – caso seja eleito - vai querer renegociar o dito tratado europeu pró-regra d’ouro anti-déficit, tratado esse que ele, primeiro-ministro britânico recusou? Efeitos do discreto charme da Frau Merkel?


Mariano Rajoy, é verdade que assinou o tal tratado anti-défice, mas mal a cerimónia acabou, cerimónia que foi bastante rápida, menos de 15 minutos, o nuestro hermano entrou na sala ao lado para, em conferência de imprensa anunciar que o défice espanhol para 2012 ia ser superior ao que tinha sido acordado com os burocratas de Bruxelas. Acrescentou que essa era uma decisão soberana de Espanha. Olé!


Último convidado para esta história de pacto. Mário Monti é presidente dum governo dito tecnocrata. Foi nomeado pelo presidente da república italiano, Giogio Napolitano.


Napolitano e a grande maioria dos italianos queriam ver-se livres do Berlusconi, foram buscar o Monti.


Mario Monti conseguiu impor aos partidos italianos uma política que não passa por privatizações nem por fortes medidas de austeridade e que privilegia a luta contra os privilégios das muitas corporações italianas que vivem à custa do Estado. E, quanto aos burocratas de Bruxelas e ao eixo franco-alemão, as suas posições têm sido cada vez mais críticas.


É certo que na lista do Der Spiegel nada parece bater certo: Cameron, Rajoy, Monti, juntos com Angela Merkel, aliada de Sarkozy, contra o mais que provável futuro presidente de França?


Esta merkeliana lista faz-me pensar na Rússia de Vladimir Putin.


Putin apoia o regime criminoso da Síria, apoia os massacres do Bashar Al Assad contra o seu próprio povo, porque tem interesses económicos a defender, porque a Síria lhe empresta uma base naval com saída para o Mediterrânio. Ò Putin, o que é que vais fazer quando o Assad for fazer companhia ao Ben Ali, ao Kaddafi e ao Moubarak?


É a velha história dos políticos que, porque se se sentem poderosos e inatingíveis, manipulam, mentem, matam e deixam roubar se for preciso. O poder, mesmo que não seja absoluto, corrompe absolutamente.


A chanceler alemã podia ter escolhido para a sua lista anti-Hollande gente cuja fidelidade e irmandade germanófilas não levantassem a mínima dúvida: Finlândia, Áustria, Holanda…
O problema alemão em incluir essa gente na tal lista é que, se eles não põem em causa a hegemonia alemã, então não faz qualquer sentido ameaçá-los.


E a lista publicada pelo Spiegel é uma lista de países e governos que a Alemanha quer ameaçar.


Tudo isto porque o projecto de hegemonia alemã sobre Europa se aproxima do momento da verdade.


Tal projecto não é ameaçado pelo Reino-Unido, e muito menos pela Irlanda.


Os manipuladores ao serviço do governo alemão colocaram David Cameron na lista apenas para disfarçar.


Porque, o que ameaça as ambições germânicas são os países latinos da união.


Contra a vitória de Hollande nas presidenciais francesas, que poderá ser a estocada final nessas ambições, a Alemanha merkeliana lança uma mensagem aos seus colegas euro-latinos.


Mensagem de ameaça e de chantagem, mensagem patética.


Mas os povos latinos europeus estão a dar sinais de que seguirão o rumo da sua antiquíssima história. A Alemanha jogou a sua última carta com o pacto anti-défice assinado no dia 2 de Março. Jogou e perdeu.


Poucos minutos depois da assinatura, Mariano Rajoy veio explicar que essa história do défice era uma questão a resolver pelo governo espanhol. Bye-bye Merkel, bye-bye Bruxelas!


Haverá provavelmente ainda muito sangue, suor e lágrimas, but the times they are changing!



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