Não fiz nenhuma sondagem, faltam-me os meios para isso, mas tenho o feeling de que por aí fora e não apenas no nosso rectângulo, haverá muita gente que se interroga sobre o que é isso de ser cidadão dum país falido que se tornou objecto da galhofa mundial.
Gente que, como eu, tenta perceber o que é que se está a passar realmente, para além do circo mediático.
Nesta estória da ajuda externa contada às criancinhas que é agora o teatro quotidiano das nossas preocupações, a televisão tem aproveitado sobretudo os aspectos mais folclóricos. Com os seus cameramen e jornalistas de microfone em punho, lá vai perseguindo aqueles burocratas Euro-FMI de óculos e fato escuros com as pastas também escuras que procuram passar despercebidos por entre o Terreiro do Paço.
São apresentados quase como fantasmas vingadores, mas nem sequer são os executores da vontade dos presumidos cuidadores das nossas finanças, eles são apenas os funcionários dos seus patrões, imagino que são funcionários muito competentes com salários à altura e talvez muito acima.
Mas, quem são os patrões desta gente acabada de desembarcar? É a Comissão Europeia de Bruxelas, é o Banco Central Europeu de Frankfurt? Ou é o Fundo Monetário Internacional de Washington?
Confesso que, à luz das notícias que li hoje, 14 de Abril de 2011, fiquei com sérias dúvidas, não consegui perceber quem é que está a mesmo a conduzir esta operação neo-colonial pós-moderna.
Lá vem o inevitável sr. Juncker, primeiro-ministro do Luxemburgo e presidente do chamado Euro-Grupo, é um grupo, é um bando não sei bem como designá-los. O que é certo é que manda na moeda da moda, o euro.
Não lhes vou chamar salteadores, isso seria muito grave, vejo-os mais como um grupo de gendarmes sempre pronto a passar ao ataque. Ataque contra os alvos mais fracos, naturalmente.
Aquele distinto euro-luxemburguês que preside a esse grupo-bando de gendarmes teve a oportunidade de mandar dizer aos portugueses (não aos que trabalham lá no Luxemburgo, sem os quais, aliás, esse pequeno grão-ducado não seria tão rico como é), mandou para Portugal o seu recado do dia: os partidos portugueses devem-se concentrar nas suas “obrigações nacionais e europeias” e deixarem de lado a campanha eleitoral. Estou a citar do Público. Não façam campanha eleitoral, não discutam, não pensem, elejam os partidos que a gente cá no euro-grupo entende que devem ser eleitos. Elejam os principais partidos, aqueles que foram defendidos tão a propósito pelas 47 ilustres personalidades do Expresso.
Está bem, sr. Junquer, a gente vai fazer como manda. Citemos agora um novo personagem neste teatro do absurdo.
O Sr. Dominique Strauss-Kahn, poderoso presidente do poderoso Fundo Monetário Internacional, com sede em Washington, D.C., mandou um sério aviso, não a Portugal, valha-nos isso, mas a um outro grupo de senhores muito mais poderosos do que o próprio FMI, o chamado G20.
Começou por preveni-los sobre o que iria dizer: “Nem todos vão concordar na totalidade com este discurso”. Novamente, citação do Público.
E, a seguir, o sr. Kahn disparou que “esta década deve ser aquela em que levamos a sério o emprego”, caso contrário, será uma “sentença de morte” para toda uma “geração perdida” de jovens.
Obrigado, sr. Strauss-Kahn, imagino que tenha estado cá em Lisboa na Avenida da Liberdade no passado dia 12 de Março!
Ainda bem que alguém tão importante como o sr. nesta era da globalização se deu ao incómodo da viagem, mas valeu a pena porque isso o ajudou a perceber a mensagem da nossa geração à rasca, que aliás não é diferente da de outras gerações sem futuro, parecidas por essa Europa fora, sobretudo cá mais para o sul.
Bem haja! Deus é grande! Lemos os jornais, voltemos à realidade, volto aos meus botões, e pergunto afinal para quem é que aqueles tipos de óculos escuros do Terreiro do Paço trabalham? Alguém me sabe responder?
Talvez alguém tenha explicado, talvez alguém tenha respondido, mas não tive a oportunidade de ouvir, de ler. Ponho-me, então, a elucubrar hipóteses.
O resultado das minhas elucubrações não é brilhante.
A prazo, ou seja, nos próximos quatro ou cinco anos, depois logo se verá, não há escapatória.
Vamos ter que amargar grátis, amargar grátis quer dizer que vamos ter que pagar a doer esta bancarrota nacional, muito nossa, bancarrota fabricada por uma criminosa tribo de banqueiros, políticos e grandes empresários portugueses aliados e servidores do eixo Berlim/Bruxelas e do grande capital financeiro internacional.
Vamos amargar grátis, com o bom povo português a votar como o sr. Junquer e as 47 personalidades mandaram. Nada vai mudar, tudo vai ficar pior. Não vou repetir o que já aqui escrevi.
Quanto ao sr. Kahn, não precisei da descida do Espírito Santo sobre a minha mente, para perceber o sentido exacto da sua mensagem aos grandes do G20.
Monsieur Dominique é um distinto político francês e socialista, bem apessoado, teve uns problemas de assédio feminino mas isso agora não vem ao caso, um importante político que é a grande esperança da desacreditada esquerda, a francesa e a europeia.
Este distinto político de esquerda está a iniciar a sua campanha para ser o próximo presidente da república francesa. As sondagens dizem que está muito bem posicionado, ele é o grande favorito.
Político socialista, político brilhante, o sr Strauss não quererá certamente aparecer aos olhos do eleitorado francês com a imagem dum implacável burocrata do FMI que impõe a países doentes medidas de austeridade impiedosa que levarão à morte social gerações inteiras de jovens.
O sr. Kahn não precisa que lho digam, ele sabe muito bem, neste seu percurso para substituir François Miterrand, para que lado é que deve cair.
Então, temos aqui duas mensagens contraditórias que convém interpretar. É crucial percebê-las, porque são as mensagens dos dois patrões da brigada que vem preparar a execução de mais desgraças para o desgraçado país que temos sido desde que, pelo menos, começou este malfadado milénio.
Ao contrário do que se poderia pensar a partir do que ficou dito para trás, a mensagem mais interessante não é a do Dominique Strauss-Kahn, é a do sr. Juncker.
É que essa é a mensagem é a mais rica em sub-entendidos.
Quando um alto responsável do directório de Bruxelas se dá ao desplante de transmitir um recado como aquele que nos enviou, não se trata, aliás, dum recado é uma ordem, diria mais, não é uma ordem é um verdadeiro golpe de estado executado sem alguém se ter dado ao trabalho de ter disparado um único tiro, quando isso acontece, será que se trata do gesto de um chefe seguro no seu posto de comando?
Confesse, Mr. Juncker, o seu desplante, a sua arrogância, as suas preocupações são outras, têm alguma coisa a ver com Portugal, mas têm sobretudo a ver com os fundamentos e o futuro do euro. É que, sr. Junquer, para além do Luxemburgo e sem o Euro, qual será o seu poder, qual poderá ser a sua importância de político de facto importante e influente nestes jogos? Há anos que se anda a divertir sentado nesse fauteuil de Monsieur Euro!
Confesse, o que o preocupa realmente não é tanto Portugal, é mais o efeito de contágio da cacofonia que se anuncia nessa Terra do Nunca que vai ser a Eurolândia.
Pequena síntese desse futuro anunciado, temos as eleições na Finlândia, país gelado saído do anonimato directamente para o firmamento das grandes estrelas de sucesso do capital.
Altamente provável, sr. Juncker, a Finlândia vai votar euro-céptico, as consequências disso já foram anunciadas há alguns dias pelo seu Ministro das Finanças, ministro que um distinto comentador indígena considerou há alguns dias como o melhor ministro das finanças da união europeia. Quem sou eu para lhe retirar esse mérito.
A Finlândia vai vetar a "ajuda" a Portugal". Está escrito, Deus os ajude!
Mas temos outras dinâmicas euro-cépticas na file d’attente para dar cabo do euro.
Não falemos para já da Alemanha nem da progressão dos Verdes e do declínio da chanceler Merkel. É outra questão para tratar mais tarde.
Temos para já a França, falemos da Marine Lepen, acho que é assim que a senhora se chama. É a patroa duma nova extrema-direita, on dirait moderne e sem preconceitos. Esqueçamos o seu discurso sobre os imigrantes.
É um discurso sem futuro, porque não vão ser precisos muitos anos para que os europeus sejam obrigados a ir buscar directamente a África os imigrantes de que vão precisar para porem as suas empresas a funcionar. Adeus, ilha de Lampedusa, adeus estreito de Gibraltar.
Mas o discurso sobre a Europa e sobre a globalização desta nova extrema direita arrisca-se a ter muito sucesso e isso, aliás, já está à vista. Um discurso sobre temas que a esquerda-caviar com notoriedade reconhecida ignora.
A Lepen aparece em primeiro lugar em todas as sondagens acerca das presidenciais francesas do próximo ano.
Está preocupado, não está sr. Juncker? Como eu o compreendo! É que esse belo edifício do euro, essa bela construção quase soviética estilo planos quinquenais dos PECS e do poder colonial de Bruxelas vai chegar um belo dia em que acabará por ir água abaixo.
E não falei da Itália, da Liga Italiana, nem da Espanha e da Catalunha, não vale a pena. Os factos, outros factos vão aparecer naturalmente, não digo espontaneamente. As sementes, os tubérculos já estão na terra prontos a germinar.
O sr. Junker é um político e um financeiro, se não o fosse não ocupava os lugares que ocupa. Por isso, deve saber que as moedas não são apenas instrumentos de transacção, de comércio.
Sendo o comércio a principal forma de as pessoas e os povos se relacionarem, daí se infere que cada moeda é uma entidade política. O dólar, por exemplo, é uma entidade política. Mas, para ser reconhecido como tal, foi necessária uma guerra civil.
As moedas não são um jogo de gabinete. Exprimem as teias sociais, dão corpo a identidades nacionais, a solidariedades e a entendimentos colectivos.
Estes senhores de Bruxelas, instalados lá nos seus gabinetes não percebem estas coisas, fazem as suas contas, mandam os seus funcionários, mandam as suas ameaças, os seus diktats.
Não percebem que, para o português médio nas suas penas quotidianas, no seu sofrimento, na desesperança que o atormenta e o desencoraja cada vez mais, o euro passou a ser um instrumento de dominação, de alienação, de perda de liberdade.
Vendo e ouvindo a televisão, este português chamado médio não pode deixar de perceber mais dia menos dia, no silêncio dos seus botões, que, nestes preocupantes dias que vai vivendo, está em curso um golpe de Estado conduzido pelos senhores do euro.
Sinceramente, digo então para os meus próprios botões muito desaparelhados, preferia que aqueles senhores de óculos escuros que caminham apressados por entre o Terreiro do Paço estivessem cá a mando apenas do FMI.
É que o FMI, a gente sabe do que é que se trata, já cá estiveram, de qualquer das maneiras vamos ter que nos sacrificar, não temos escolha, mas depois livramo-nos deles.
Pelo contrário, com o sr. Juncker a mandar, a mando da sra. Merkel e do sr. Barroso, o que vai acontecer é que os sacrifícios vão ser muito mais pesados e que, no fim, não nos vamos conseguir livrar deles, desses gajos de Bruxelas. Haverá alguma esperança no meio deste pesadelo?
A esperança é sempre a última a morrer. Confiemos, é muito provável, tudo aponta para que a tal de união europeia e o tal de euro vão em breve explodir num belo fogo de artifício. Deus é grande, os sinais de que isso venha a acontecer são muito prometedores.
Obviamente, nesses sinais não incluo o veredicto dos eleitores indígenas do próximo dia 5 de Junho. Infelizmente, eles fiéis aos seus brandos costumes vão obedecer a Bruxelas, têm medo, nada vai mudar, vão designar os “principais partidos” do costume para continuarem a “mandar”nesta pseudo-república.
É quase certo, nesta nova década, ao contrário do discurso do sr. Dominique Strauss-Kahn, tudo vai ficar pior, a guerra social vai-se intensificar.
Até ver, poderá acrescentar algum espírito mais iluminado do que o meu!
Como explicou a Scarlett O’Hara, tomorrow is another day!
1 comentário:
Isto faz-me lembrar a ocupação de Portugal pelo generalJunot, recebendo ordens de Napoleão para governar Portugal, enquanto a soldadesca rapinavam tudo o que encontravam e o nosso governo "patrótico" se punha ao fresco. O pior é que os nossos "salvadores" revelaram-se tão usurpadores como os invasores.
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