O homem demorou 45 minutos a aparecer no ecrã para apresentar a sua comunicação em directo na têvê. Grande expectativa, essa malta da televisão quase entra em transe nestas alturas, é que o momento parecia, devia ser, grave e solene.
Primeiro directo, às 20 horas, o homem apresentou-se em mangas de camisa, não se percebeu o que é que estava para ali a dizer.
Segundo take, muito mais tarde, lá apareceu ele com o seu ar do costume de vendedor de banha da cobra, já não estava em mangas de camisa, apareceu com um fatinho e pôs-se a falar. Disse alguma coisa que valha a pena reter?
Disse sim, sou testemunha disso, o homem disse exactamente o contrário do que tinha continuado a afirmar no dia anterior com sua apaixonada convicção do costume, vendendo o seu peixe, que não queria ajuda externa para Portugal, que estava em causa o superior interesse do país, que acima de tudo era isso que interessava defender.
Agora, naquele momento sério e solene, com o seu fatinho e em directo na televisão, tinha outra opinião, outras notícias para dar, quem estava mais atento percebeu que pela sua nova opinião passaram por ali os nossos respeitáveis banqueiros.
Ficámos então a saber que ele primeiro-ministro demitido José Sócrates, decidiu pedir ajuda ao exterior, mas quanto ao resto, quanto àqueles pequenos pormenores quanto é que isso da ajuda externa vai custar em moeda de austeridade, cortes de pensões, cortes de salários and so on, quem é que vai dar a tal “ajuda”, quantos milhares de milhões é que vão emprestar e quantos é que os que dão a “ajuda” vão receber…
Ficámos na mesma, o homem não explicou nada, fez a sua propagandazita do costume, ele é o maior, o PS é que é o grande partido da esquerda popular, tudo o resto são sabotadores.
Muitos dos que presenciaram mais esta cena terá gostado do discurso, normalmente quem aparece a falar na televisão sobretudo se parece que têm algum poder, as pessoas em geral apreciam muito, não duvido, sabe-se lá, até é possível que o homem volte a ganhar as eleições. Case study, país sadomasoquista.
E, a seguir em resposta a mais este cansativo número de circo, é assim que manda a democracia televisiva, veio o outro, o chefe da alternativa da oposição.
Alguém conseguiu reter alguma coisa do que este outro nos veio dizer?
Devo estar cansado dos pingue pongues entre os protagonistas políticos do momento, sinceramente não percebi nada, por outras palavras, o que percebi é que este outro homem de nome Passos supostamente líder da oposição não tinha nada para dizer. Alguém o pôs ali a falar, parole, parole, parole…Em que é que ficamos?
Sejamos politicamente incorrectos, chega de conversa.
Haverá por aí alguma cabeça iluminada, inspirada pelos deuses? Não estou a querer dizer a palavra líder, para mim essa é uma palavra afascistada.
Portugal tem uma longa história de sacrifícios e de pobrezas, de gente muito sacrificada vítima da miséria. Séculos.
E também uma longa história de uns quantos que se vão habilmente aproveitando dessa miséria dos mais fracos.
Uma longa história dominada por sanguessugas, que se alimentam da corrupção e da incompetência de elites cuja arrogância de classe não tem limites.
Sejamos então politicamente incorrectos, sejamos consequentes, falemos de alternativas. Depois das eleições de 5 de Junho o que é que vai mudar?
Nada vai mudar, vai tudo voltar a Março de 2011, o que quer dizer que vai tudo ficar pior. O Bloco e o PC vão fazer a sua apressada encenação de “esquerda”, o BE bem que precisa de ajuda.
O PS vai tentar furar o cerco, para já vai querer sobreviver, depois se verá.
O PSD provavelmente vai para o governo e logicamente vai privatizar a Caixa Geral de Depósitos, o Serviço Nacional de Saúde e a Educação, neo-liberalismo a quanto obrigas, de facto esta gente não tem qualquer espécie de imaginação.
O CDS vai tentar colocar alguns pedregulhos no caminho do PSD.
Cenários alternativos?
Sejamos então completamente e definitivamente politicamente incorrectos.
Imaginemos. O pessoal votante, que se vai apresentar no dia 5 de Junho perante as mesas de voto, decide mandar de volta à sua insignificância os dois partidos gémeos do chamado arco de poder.
Ambos têm alternado no poder, supostamente um é socialista o outro será social-democrata. Até hoje não consegui perceber a diferença entre um e o outro.
A grande maioria dos votantes mandam-nos então embora, já chega, e escolhem uma espécie de coligação entre comunistas e democrata cristãos, compromisso histórico, estilo Aldo Moro.
Uma cena inesperada, uma espécie de desfecho estilo Islândia ou mesmo estilo Irlanda.
Se é o povo é quem mais ordena, então mandem essa gente embora, do passado façamos tábua rasa, é essa a proclamação que vem no hino da Internacional.
Isto de estarmos para aqui a imaginar a imaginação ao poder, são delírios inconsequentes.
O sistema de poder, a alternância partidária não vão mudar, claro que vão mudar os boys, tem que haver alguma alternância, mas os votantes vão eleger os servidores do costume.
Continuem, pois, a queixar-se!
1 comentário:
A austeridade é uma declaração de guerra social. "O tudo vai ser pior" é capaz de ser um bom sinal. A ver vamos!
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