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domingo, 6 de junho de 2010

PRESIDENCIAIS: LEIAM A CONSTITUIÇÃO



Leiam a Constituição, está lá tudo o que é importante para governar o país à esquerda.

É que, apesar de todas as revisões, a nossa lei fundamental continua a ser uma lei que impõe que se governe o país à esquerda. Não admira, por isso, que os sectores mais militantes da direita continuem a sonhar acabar com ela. Não admira que quase tudo o que lá está escrito tenha sido sistematicamente ignorado durante os longos anos de governo PS/PSD.

Passemos em revista apenas alguns artigos.

Todos têm direito ao trabalho. Para assegurar o direito ao trabalho, incumbe ao Estado promover a execução de políticas de pleno emprego (artigo 58º). Em que ponto estamos: mais de 700.000 desempregados.

A organização económico-social assenta nos seguintes princípios: subordinação do poder económico ao poder político democrático; coexistência do sector público, do sector privado e do sector cooperativo e social dos meios de produção; liberdade de iniciativa e de organização no âmbito de uma economia mista; protecção do sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção (artigo 80º).

Economia mista, a que se conhece é a da promiscuidade entre políticos e negócios privados, por outras palavras, submissão do poder político e do Estado ao poder económico do capital privado.

Quanto ao sector da economia social, o terceiro sector, há muito que ele passou a ser considerado uma utopia provavelmente esquerdista de auto-gestionários que não sabem o que fazer à vida.

Incumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social promover a coesão económica e social de todo o território nacional, orientando o desenvolvimento de todos os sectores e regiões e eliminando progressivamente as diferenças económicas e sociais entre a cidade e o campo e entre o litoral e o interior (artigo 81º).

Políticas de coesão territorial? Fecho de maternidades, de centros de saúde, de escolas, de estações de correio, de serviços públicos. Resultados palpáveis: mais desertificação, mais envelhecimento demográfico, mais concentração urbana, mais poluição, mais desperdício de recursos, quais os limites territoriais da soberania do Estado?

A tributação do consumo visa adequar a estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social, devendo onerar os consumos de luxo (artigo 104º), como, por exemplo, o IVA dos ginásios, é isso.

Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei (artigo 103º). O Teixeira dos Santos é especialista neste artigo.

Vale a pena continuar?

Para protecção da família incumbe ao Estado, designadamente: promover a criação e garantir o acesso a uma rede nacional de creches e outros equipamentos sociais de apoio à família, bem como uma política de terceira idade (artigo 67º). Estamos conversados.

Na realização da política de ensino incumbe ao Estado estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino (artigo 74º). Ou seja, o Estado tem-se incumbido em aumentar, progressivamente valha-nos isso, as propinas do ensino superior público.

O nosso regime é semi-presidencialista, dizem os entendidos. Há também quem diga que é idêntico ao sistema francês, o que é quase verdade. Diferença: enquanto em França, é o Presidente da República que, por direito próprio, preside ao Conselho de Ministro, em Portugal, isso só poderá acontecer quando o Primeiro-Ministro o solicitar (artigo 133º). Não me lembro que isso tenha acontecido e, se aconteceu, terá sido apenas puro folclore.

O facto de o Presidente da República não presidir por direito próprio ao Conselho de Ministros não é um pequeno pormenor, mas em política nada é definitivo. No caso em apreço, basta retirar do artigo 133º as palavras “quando o Primeiro Ministro lho solicitar” e os poderes presidenciais tornar-se-ão mais claros para toda a gente.

Mas, bem vistas as coisas, lida com toda a atenção a Constituição da República, a ampla latitude da intervenção presidencial na vida política não deixe muita margem para dúvidas: ele é o Comandante Supremo das Forças Armadas (artigo 134º) e nomeia e exonera o Primeiro-Ministro (artigo 130º).

Mas mais importante ainda, o Presidente da República quando toma posse é obrigado a prestar a seguinte declaração de compromisso: “Juro pela minha honra desempenhar fielmente as funções em que fui empossado e defender, cumprir e fazer cumprir a constituição da República Portuguesa” (artigo 127º).

Fazer cumprir o quê?

Fazer cumprir a plena soberania do Estado e as suas obrigações estratégicas, das quais aqui foram dados alguns exemplos: garantir a igualdade de todos perante a lei, garantir o direito ao trabalho e ao pleno emprego, submeter os poderes económicos ao império da lei e do interesse geral, apoiar a economia social, promover a equidade territorial, apoiar as famílias e os casais que desejam ter filhos, assegurar a gratuitidade universal do ensino em todos os graus. E muitas outras coisas.

A tremenda responsabilidade deste compromisso solene coloca o Presidente da República na primeira linha dos deveres de soberania do Estado.
À frente e não atrás do Primeiro-Ministro.
À frente, não apenas porque jurou o compromisso, mas principalmente porque, ao contrário do Primeiro-Ministro, ele foi eleito por sufrágio universal.

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